terça-feira, 3 de abril de 2012

Tesouro astral

Pobre novamente estou
E nenhum ouro mais reluz
Nenhum brilho seduz
Nem sei pra onde vou

Sem caminho nem destino
Procuro lâmpadas pro caminho
Iluminar a estrada
que parece levar a nada

Procuro, cavo e pergunto
Onde está a luz?
Preciso iluminar meu dia
Que ontem escureceu

segunda-feira, 2 de abril de 2012

Infinitos (4) Clarice Lispector


SAUDADE
(Clarice Lispector)

Saudade é um pouco como fome.
Só passa quando se come a presença.
Mas às vezes a saudade é tão profunda
que a presença é pouco:
quer-se absorver a outra pessoa toda.
Essa vontade de um ser o outro
para uma unificação inteira
é um dos sentimentos mais urgentes
que se tem na vida.

ps> Texto de Clarice Lispector adaptado em versos por Antônio Damásio.

sábado, 31 de março de 2012

10 da manhã

No dia em que acordei
minha mãe me disse:
-Para de chorar meu filhinho.
O tapa na bunda dói,
mas logo vem o leitinho

sábado, 24 de março de 2012

Compondo uma vida

Faria um rock com pandeiro
tocaria um batidão
um sambinha bem maneiro
pra tocar o coração

Com a leveza de um bolero
E a elegância de uma valsa
teria firmeza do tango
Tocaria ao som da arpa

Teria que ser heavy metal
Um pesado rock in roll
E não podia deixar
De falar de dor e amor

Teria um verso gospel
Para de Deus lembrar
E duas notas de bossa
para o corpo relaxar

De reggae teria também
Umas batidas na guitarra
Para mexer o esqueleto
uma pegada pagodão

Algo bem nordestino
Um xaxado ou baião
Para simplificar
a essência desse som

No finalzinho sem querer
seria obrigado a botar
um acorde melancólico
para a morte indicar


terça-feira, 28 de fevereiro de 2012

Infinitos - Fernando Pessoa


ABDICAÇÃO


Toma-me, ó noite eterna, nos teus braços
E chama-me teu filho... eu sou um rei
que voluntariamente abandonei
O meu trono de sonhos e cansaços.

Minha espada, pesada a braços lassos,
Em mão viris e calmas entreguei;
E meu cetro e coroa - eu os deixei
Na antecâmara, feitos em pedaços

Minha cota de malha, tão inútil,
Minhas esporas de um tinir tão fútil,
Deixei-as pela fria escadaria.

Despi a realeza, corpo e alma,
E regressei à noite antiga e calma
Como a paisagem ao morrer do dia.

quarta-feira, 8 de fevereiro de 2012

Reticencia

Eu queria pensar em algo.
Pra dizer o que é,
ou será,
que foi um dia?

Algo pra falar de mim,
ou do mundo.
Talvez só,
de você.

Queria algo menos
confuso de mais
pra descrever
o que disse.

Infinitos - Ruy Espinheira Filho

SONETO DA JUSTIFICAÇÃO
(Ruy Espinheira Filho)

a Mário Vieira

Esta noite (ele pensa) justifica
— com seu luar abençoando os ramos
do pé de carambola — os estertores
de que surgiu o Universo. Fica

tudo, tudo (ele pensa) redimido.
Deuses. Deus. O Acaso. Não importa.
Valeu (eis o milagre em sua porta!)
a pena que custou a gestação

deste momento. O qual lhe justifica
(ele suspira), enfim, a paciência
de — até chegar a este luar nos ramos —

ter (calcula) esperado cinco décadas,
sessenta dias e, fechando as contas,
alguns punhados de bilhões de anos.