domingo, 22 de novembro de 2009

Historia da infancia

Como falei no post inicial, meu avô costumava contar histórias em forma de cordel, muitas vezes contadas. Vai ai pra vocês o que eu mais de gostava de ouvir. Não é muuuito pequeno mais vale muuuuito a pena.

Há, eu queria colocar uma imagenzinha aqui pra ilustrar e enfeitar mais ainda não sei fazer isso, então fica para os próximos posts...



A Intriga do Cachorro com o Gato

Autor: J. Ferreira da Silva


A intriga é mãe da raiva
O mau pensamento é pai
Da casa da malquerença
O desmantelo não sai
Enquanto a intriga rende
A revolução não cai.

Quando cachorro falava
Gato falava também
Gato tinha uma bodega
Como hoje os homens têm
Onde vendia cachaça
Encostado ao armazém.

Com a balança armada
Para comprar cereais
E na bodega vendia
Bacalhau, açúcar e gás
Bolacha, café, manteiga
Miudezas e tudo mais.

Quando no tempo de safra
Comprava mercadoria
Chegada no armazém
Que todo bicho trazia
Vou dizer pela metade
Esta grande freguesia.

O peru vendia milho
O porco feijão e farinha
Com um cacho de banana
Mais tarde o macaco vinha
Raposa também trazia
Um garajau de galinha.

Carneiro passava a noite
Junto com sua irmã
Descaroçando algodão
E quando era de manhã
Para o armazém do gato
Botava sacos de lã.

Guariba vendia escova
Que fazia do bigode
Urubu vendia goma
Porque tem de lavra e pode
A onça suçuarana
vendia couro de bode.

Então todo bicho tinha
No armazém seu contrato
Porém vamos deixar isto
Para tratar de outro fato
Relativo à intriga
Do cachorro com o gato.

Rei leão mandou cachorro
Efetuar uma prisão
O cachorro passando
Na venda do gato então
Pediu para beber fiado
E o gato disse: pois não.

Subiu na pratileira
Uma garrafa desceu
Um cruzado de cachaça
O cachorro ali bebeu
Botou fumo no cachimbo
Pediu fogo e acendeu.

E disse compadre gato
Eu vou prender o preá
Porque carregou a filha
Do coronel cangambá
E mesmo já deve a honra
Da filha do seu guará.

E tornou dizer compadre
Bota mais uma bicada
Eu só sei prender valente
Depois da gata esporada
O gato sorriu e disse:
Esta não lhe custa nada.

O gato bebeu também
O cachorro repetiu
Botou o copo na banca
Saiu na porta e cuspiu
O gato puxou um lenço
Limpou a barba e tossiu.

Embebedaram-se os dois
Garrafas secaram 3
Cachorro fez um discurso
Falava em língua inglês
Gato embolava no chão
Também falando francês.
A gata mulher do gato
Saiu do quarto veio cá
E disse muito zangada
Vocês dois procedem mal
O gato disse: mulher
Da porta do meio pra lá.

O gato ficou deitado
O cachorro foi embora
Ouviram dizer: ô de casa
A gata disse: ô de fora
E quem é respondeu raposa
Sou eu que cheguei agora.

Disseram entre comadre
O gato levantou-se
Sentou-se numa cadeira
Esposa também sentou-se
Ele contou à raposa
De que forma embebedou-se.

A raposa disse: compadre
Você não pensou direito
Bebendo com o cachorro
Um safado sem respeito
Se seus amigos souberem
O senhor perde o conceito.

Beba com os seus amigos
Seu irmão maracajá
O tenente porco-espinho
E o capitão guará
Major porco e doutor burro
E o coronel cangambá.

Eu também gosto da troça
Bebo, danço e digo loas
Mas com gente igual a mim
Civilizadas e boas
Que não vou andar com gente
De qualidade à-toa.

Só me dou com gente boa
Como compadre urubu
Dona ticaca de souza
E dona surucucu
A professora jibóia
E o meu primo timbu.

Você é conceituado
Da roda palaciana
Cachorro vive na rua
Tanto furta como engana
Com o baralho no bolso
Jogando e bebendo cana.
E ele compra fiado
Porque quer mas ele tem
Uma muchila de níquel
Que por detrás se vê bem
Pindurada balançando
Porque não paga a ninguém.

O gato se pôs em pé
Perguntou admirado
Comadre, isto é verdade?
Ele me deve um cruzado
Eu não dei fé na muchila
Por isto vendi fiado.

Porém eu vou atrás dele
Daquele cabra estradeiro
Dou-lhe um bote na muchila
Arranco e tiro o dinheiro
Sendo eu disse a raposa
Passava o granadeiro.

O gato se preparou
Amarrou o cinturão
Correu as balas no rifle
Passou lixa no facão
Botou um quarto e bebeu
De aguardente com limão.

Chegou lá disse ao cachorro:
É triste o nosso progresso
Você paga o meu cruzado
Ou quer que eu pague um processo
Cachorro afastou o pé
E lhe disse eu não converso.

Ali deu um tiro e disse:
É assim que eu despacho
Porém o gato abaixou-se
Passou-lhe o rifle por baixo
Deu-lhe uma balada certa
Que quase derruba o cacho.

O cachorro que também
Tem pontaria fiel
Tornou passar a pistola
A bala deu um revel
Cortou-lhe o rabo no tronco
Que descobriu o anel.

Depois que trocaram tiros
Divertiram no punhal
Pulava o gato de costas
E dava salto mortal
Cachorro por sua vez
Também traquejava igual.

E ali trancou-se o tempo
Na porta do barracão
Da baronesa preguiça
Comadre do rei leão
E ela telegrafou
Pedindo paz na questão.

O leão passou depressa
Um telegrama pra trás
Minha comadre alevante
A bandeira e grite paz
Ela não tinha bandeira
Levantou a macaxeira
E ali ninguém brigou mais.

15 comentários:

  1. Sem dúvida esse foi o cordel mais cantado de todos os tempos na família!
    Muito bom...

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  2. POxa, muito legal...
    Vitão tbem é cultura...

    Siga em frente Vitão que estarei acompanhando...

    Tio Yuri

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  3. Olá Vítor,
    Muito bom esse cordel. Mas, ainda melhor é a sua disposição em manter vivo esse gênero literário que, pouco a pouco, vai se esvaindo do imaginário popular.

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  4. olá vitor araujo,

    achei muito legal essa historia da intriga do cachorro com o gato, pois ha muito tempo não lia nem ouvia a mesma, mas gostaria que voce por gentileza postasse uma outra historia tambem de intriga do "CACHORRO COM O GATO" por um palito de fósforo.

    obrigado

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  5. vitor araujo...

    gostei demais desse cordel "INTRIGA DO CACHORRO COM O GATO", estava com muita saudade dessa históra, que tinha lido ha uns 15 anos atrás, em um pequeno folheto, o mesmo estraviou-se, e nunca mais tinha encontrado, estou muito feliz por ter lido novamente essas belissimas estrofes.

    muito obrigado!!!


    A.C.

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  6. Grande Vitor,

    Esse cordel meu avó tambem canta eu estava procurando ele faz tempão, muito bom entre outros cordeis esse mim fascina.

    Abraço

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  7. Valeu, custei a encontrar este cordel que meu pai me contava de criancinha. Helio Rangel

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  8. Ao anonimo que comentou e pediu para eu postar a "Entriga do cachorro com o gato por um palito de fósforo", desculpa n ter dado nenhuma satisfação mas não tinha visto o comentario.POr enquanto só encontrei uma parte desse cordel. Estou procurando na integra para poder postar.

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  9. Este comentário foi removido pelo autor.

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  10. Nossa, a muito eu procurava esse texto, meu pai me contava e o pai dele contava a ele, eu contarei aos meus filhos! Obrigado Miguel!
    Uma ressalva apenas, o autor é J. ferreira da silva, Pacheco publicou "A intriga do cachorro com o gato por um palito de fosforo" em 2006 se não me engano, ele é jovem!

    Muito grato!

    Marcos gomes

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  11. Q bom Marcos que pude te ajudar de alguma maneira. E obrigado pela correção. Providenciareis o ajuste imediatamente.

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  12. Nossa quase chorei... meu avô falava isso para mim...
    muito bom

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  13. po achei que vovô que tinha inventado essa história uAHsuAhsuAs

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  14. Meu pai recitava esses versos quando eu era criança e olha que estou com 49 anos. Foi muito bom encontrar essa literatura.

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  15. Meu pai me contava essa história desde pequeno to com 21 anos sei dela toda de có desde 6 anos, perdi meu pai a 7 meses e essa história me faz relembrar grandes momentos de minha vida,mto obrigado amigo,kkk me emociono mto com ela.
    Daniel Henrique da Silva

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